Nampula, a província mais populosa de Moçambique volta a conquistar uma popularidade anormal: o assassinato de albinos.
O fenómeno não é novo, mas nos últimos três anos quase que não se ouvia falar. O caso mais recente deu-se em Maio findo, no distrito de Murrupula, a pouco mais de 70 km da cidade de Nampula. Tratava-se de um dia de chuva. Temendo que a casa de construção precária pudesse desabar, os avós da Carmen Paulo, 12 anos de idade, decidiram que a família devia dormir do lado de fora, numa espécie de alpendre feito de estacas com cobertura de capim. Os criminosos encontraram naquela cena a oportunidade certa para porem em prática o seu plano: à calada da noite carregaram a menina pela mata adentro e com golpes de faca no pescoço acabaram com a sua vida. Em plena noite de chuva, a população mobilizou-se em pouco tempo, seguiu a direcção que os dois homens tinham tomado e conseguiram neutralizar um deles, só que o pior já tinha acontecido.
O magistrado do Ministério Público estabelecia um paralelismo com o segundo caso registado este ano, em Março, em que uma criança albina de seis anos de idade foi sequestrada no distrito de Larde, e até hoje não há rastros do seu paradeiro.
"Declarei que revendi no Malawi para um [indivíduo] da Zâmbia a dois milhões e setecentos mil meticais." - (um dos implicados, admitindo que já tinha participação noutros assassinatos de albinos)
Foram entrevistados dois homens, um de 33 e outro de 47 anos de idade que, há quatro anos, estão no Estabelecimento Penitenciário Regional de Nampula a cumprir uma pena de 40 anos prisão maior por terem participado do assassinato de Alfane Amisse, em Setembro de 2015, na localidade de Topuito, distrito de Moma. Na altura, as imagens postas a circular de um ser humano esquartejado chocaram o mundo. Trata-se de um curandeiro, que terá sido contactado por um homem identificado por Evaristo, inicialmente para supostamente o tratar a hérnia de que padecia. Todavia, aliciado por um valor total de dez milhões de meticais para uma divisão a cinco, o curandeiro trocou a medicina tradicional pelo crime e ajudou a carregar o corpo do albino, depois de ter sido executado por Evaristo, em plena via pública, por volta das 17 horas do dia 16 de Setembro de 2015. A ideia era enterrar o corpo numa mata para, depois da decomposição, exumarem as ossadas para alimentar o negócio obscuro que vinca em muitas tradições, sobretudo nos países vizinhos, onde se acredita que um tratamento mágico com partes do corpo de um albino ajuda a dar sorte na vida, enriquecimento ou outro tipo de curas. Essas crenças estão tão enraizadas que, só no Estabelecimento Penitenciário Regional de Nampula, há outros condenados em quatro processos a penas que variam de 22 a 38 anos de prisão de consumação e tentativa de venda de partes do corpo de pessoas com albinismo.
"Temos até casos de parentes que cortaram cabelo do filho e entregaram alguém para procurar clientes." - (agente da guarda prisional)
Outro caso ainda por resolver é o de Auxílio Augusto, que desapareceu no dia 17 de Dezembro de 2014, quando tinha 21 anos de idade. Fazia parte de um grupo de dez irmãos, três deles nasceram com albinismo. Pedro Augusto foi o último a ver o irmão a sair de casa para nunca mais voltar. Auxílio terá sido aliciado por alguém que o prometeu uma vaga de emprego. O caso foi remetido à 1ª Esquadra da PRM na cidade de Nampula. Em Janeiro de 2015, o único arguido foi solto e o processo conheceu muitas voltas entre o juiz de instrução criminal e os investigadores da Polícia. E quatro anos depois, continuam mais dúvidas que certezas. Confrontado com o caso, o procurador-chefe na província de Nampula, Nazimo Mussá, garantiu que a investigação foi reaberta, estando neste momento a ser seguida uma outra linha de investigação.
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